Na minha última passagem por Londres, no distante ano de 2012, senti que percorria numa cidade onde poderia viver. Gravei a sensação de que nada me faltaria à distancia de uma viagem de metro.
Regressei apenas para uns dias de férias mas, curiosamente, abriguei-me no tecto de quem entretanto fez da capital inglesa a sua casa. Casa essa que, muito provavelmente, já é um lar distante da ocidental praia lusitana.
Independentemente da distância há ligações que se preservarão intocadas. Há um coração, um sistema nervoso central, que permanece junto de quem nos viu crescer. O conceito de família não tem limitações geográficas.
Apesar da calorosa recepção o tempo benzeu-me com uma mistura de chuva e frio. Por vezes instalava-se um céu quase limpo mas não era suficientemente azul para equiparar-se com o escaldante do sul da Europa.
Os calções que vestia foram dispensados e enfiei-me dentro de roupa mais quente que, antes da partida, resgatei à gaveta dos trapos invernais. Mesmo assim comprei um casaco porque um homem com frio não consegue alinhar os chacras.
Revisitei na cidade muitos lugares conhecidos e previsivelmente não os contemplei da mesma forma. Os autocarros de dois andares e os táxis continuam iguais mas o espaço está diferente. São outros os transeuntes e as ruas e os espaços não ficaram congeladas no tempo como uma fotografia.
Não me canso de repetir que viajar é construir uma opinião própria que se sobrepõe ao senso comum. Os países, as cidades, a natureza e as pessoas não são interpretados de igual forma pela humanidade. As percepções não são matemáticas e acresce que a perspectiva pessoal não é estática e evolui com o tempo.
É um pensamento surrealista imaginar-me em Londres há 6 anos e observar-me com os olhos de hoje. Se encontrasse esse “eu passado” poderia suspirar-lhe que lhe espera uma vida cheia de surpresas. Termino com as teorias evolucionistas apimentadas com nostalgia q.b. e regresso aos dias do presente.
Deambulei quase aleatoriamente pela cidade seguindo a beaten path. Desviei-me para passear no apinhado Portobello Road Market, na cada vez mais turística Camden Town e, junto ao Thames River, divaguei entre locais em Hammersmith e Fulham.
Quando a caminhada foi condicionada pela meteorologia enfiei-me dentro de portas: Natural History Museum (com a sua profunda homenagem a Darwin e no exterior a exposição temporária “Sensational Butterflies”), Victoria and Albert Museum e Serpentine Sackler Gallery.
Pensei espreitar o Notting Hill Carnival mas o caos envolvido não me animou. Os relatos dos locais e as fachadas dos edifícios entaipadas, como se esperassem um furacão, surpreenderam-me. Depois de pesquisar um pouco compreendi que o evento tem sido manchado por incidentes recorrentes. Na zona existiam ainda cartazes que recordavam o incêndio de 2017 na Grenfell Tower (que causou 72 mortos) e onde se apelava, pela proximidade, ao comportamento das pessoas.
Os parques em Londres (Hyde Park, os vizinhos Kensington Gardens, The Regent’s Park e St. James Park) são um luxo incansável que ganham maior esplendor numa grande metrópole. Estas riquezas naturais são pontos de encontro, lugares de passagem, referências na paisagem e espaços onde a mente se sente mais livre. Como será que os viverei numa próxima visita?
Paulo Vyve